A jazida de Icnofósseis dos Lagosteiros situa-se nas arribas da Praia dos Lagosteiros, no Cabo Espichel, nas coordenadas (38º 48’ 35’’ N; 9º 28’ 47’’ W) em lajes sedimentares do Cretácico Inferior (Hauteriviano) de há 130 – 136 Milhões de Anos. Apresentando um excelente alinhamento de pegadas de dinossáurios, sendo talves a mais notável do Cretácico Europeu e a única desta idade em Portugal (Antunes, 1976). Foi descoberta em 1971, quando uma equipa da Universidade de Lisboa, se deslocou ao local, a pedido de Eduardo Serrão e Luís Saldanha que tinham ouvido o relato de um pescador sobre a lenda das pegadas da mula que transportou Nossa Senhora do Cabo e que suspeitaram tratar-se de pistas de dinossáurios. 

“Ao procurar obter fotografias em posição mais favorável, dirigimo-nos à arriba que fecha, a Norte, a enseada. Aí, uma das pessoas que nos acompanhavam, Maria Georgina Saldanha, chamou a atenção para outra pegada na superfície que encima a arriba. A prospecção a que procedemos revelou outras e, assim, uma jazida mais moderna (Cretácico inferior), porventura ainda mais interessante” (Antunes, 1976).

Os investigadores dedicaram dois meses de trabalho de campo e desobstrução que colminaram com a caracterização de muitas pegadas, elaboração de moldes, planta da jazida e recolha fotográfica. As pistas destes dinossáurios cretácicos encontram-se, na vertente sul do caminho para a praia, os níveis 1 e 2, e o nível 3 no topo da arriba num afloramento castanho amarelado, formado por calcários, margas e arenitos, contendo fosseis de bivalves, gastrópodes, ostracodes, foraminíferos e algas.

O sítio foi classificado como Monumento Natural dos Lagosteiros pelo Decreto nº 20/97 de 7 de Maio, publicado no Diário da República nº 105/97.

Caracterização de algums tipos de icnótopos (pistas) diferentes que podem ser apreciados:


Adaptado da planta da jazida (Antunes, 1976)

Sector A - Trilho interrompido por depósitos de vertente apresentando duas zonas uma com catorze e outra com dezaseis impressões de forma arredondada, sem contorno de sedimemto nos bordos e não fornecendo informação sobre a morfologia do pé do animal, o que poderá ser interpretado como subimpressões provocadas num extracto inferior ao da superfície pisada pelo dinossáurio, tal como acontece com a pista de 127 metros do bípede de grandes dimensões da jazida de Pego Longo / Carenque. Esta pista, encontra-se no nível 1 desenvolvendo-se no sentido da praia para a arriba, até ao nível 3, numa extensão de 50 metros com a orientação Nm 110ºE – Sm 70º E. (Antunes, 1976) (fig. 9)

 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

Das trinta subimpressões apenas uma revela as marcas dos dedos, sendo notória a impressão da garra do dedo médio (fig.11).

 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

Foram atribuídas inicialmente a um grande Saurópode – Neosauropus lagosteirensis – dinossáurio quadrupede (Antunes, 1976), recentemente atribuídas a um dinossáurio bípede (Santos, Lockley, Mortala e Galopim de Carvalho, 1992). Note-se que o ângulo de passo entre as pegadas é cerca de 155º característico de pistas de dinossáurios bípedes, ângulo de passo de 150º a 180º (Santos, 2008); enquanto que as pistas conhecidas de saurópodes apresentam ângulos de passo da ordem dos 90º a 120º (Santos, 2008). 

“Tendo em conta que o estudo de outras jazidas permitiu evidenciar a relação estreita das impressões arredondadas, em pistas atribuíveis a dinossários bípedes do Cretácico, com as pegadas de iguanodontídeos, e que estes eram abundantes neste período, admite-se que esta pista de Lagosteiros tenha sido deixada por um destes dinossáurios bípedes herbívoros” (Antunes, 2010). 

"Ambiente há cerea de 125 milhões de anos da região onde actualmente se sitúa a baía de Lagosteiros, praia abrigada por barreira de recifes corálios, frequentada por dinossáurios, como Iguanodon (figurado) cujas pistas fossilizaram, (Guacho de J, P, Martins Barata sobre esboço do autor)"

Vamos analizar uma sequência de pegadas na pista superior do sector A, tendo em atenção que se trata de subimpressões, que foram produzidas por um grande bípede indeterminado, tendo os cuidados necessários para se obter os valores e fotos recolhidos em 2014, de forma a que se possa ter uma estimativa tão exacta quanto o possível do Comprimento da marca do pé, do Passo, da Passada, da Altura do membro posterior ao solo, do Tipo de deslocação e finalmente do Valor da velocidade de deslocação do animal.







Cálculos feitos pode-se já concluir que o Bípede que produziu as pegadas teria um Pé com aproximadamente 48,86 cm de comprimento, que devido ao seu elevado peso provocou moldes de Subimpressões com uma profundidade de 6,75 cm, deslocando-se com um Passo de 98,69 cm e uma Passada de 197,17 cm. Com estes valores e aplicando a fórmula adequada a Bípedes em pegadas mal conservadas (Santos, 2008), determinamos o valor expectável para o comprimento do membro até ao acetábulo (articulação da anca), que neste caso seria de 2,78 metros.





Quanto ao tipo de deslocação usamos a razão entre λ/a, sugerida por Thulborn, 1982; e Wade,1984 e obtemos um valor igual a 0,71 o que recorrendo á respectiva tabela nos indica que o animal se deslocava em marcha.

Finalmente usando a fórmula de Alexander proposta em 1976, determinamos o Valor da velocidade com que o Bípede se deslocava. 

Obtendo-se o valor de 0,73m/s o que corresponde a 2,64 Km/h.




Sector B -  Trilho com onze a treze subimpressões pouco nítidas, de forma arredondada muito semelhante ás da pista anterior, mas de diâmetro médio de 38 cm, (fig 12), situa-se no nível 3 tendo a orientação Nm 140ºE – Sm 40º E (Antunes, 1976). Foram atribuídas a formas juvenis de bípedes da mesma espécie do autor do trilho do sector A. 


 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

Sector C - Trilho situado no nível 3, constituído por 2 conjuntos de pegadas de grandes dinossáurios bípedes (fig. 16 e 17), um deles com a orientação Nm 166ºE – Sm 14ºE apresenta duas impressões paralelas e a impressão de uma cauda robusta, demonstrando a forma de repouso de um Iguanodon (Antunes, 1976), três pontos de apoio como num tripé, (Casier, 1960). O outro apresenta três impressões com passada curta 186 a 66 cm, de dinossáurio em marcha lenta com paralelo nas pistas de Iguanodonte do Sul de Inglaterra (Casier, 1960)

 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

A impressão dos pés, melhor conservada têm 45 cm, demonstra o dedo interno mais curto do que o externo e forma ângulos entre os dedos de cerca de 22º (Antunes, 1976), perfeitamente comparáveis ás de Logronõ, Espanha (Cladellas e Llopis,1971) bem como a de Hannover (Casier, 1960). Atribuídas a dinossáurios bípedes do tipo Iguanodon (Antunes, 1976). 

 

 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

Vamos analisar o caso da enigmática impressão de cauda e das respectivas pegadas, não sendo intenção pôr em causa a hipótese de dinossáurio em repouso, como a situação nos sugere de imediato. Porém tendo em atenção que se tratam de subimpressões muito desgastadas pelo tempo e que os resultados dos cálculos são meras estimativas.




Determinemos o valor a, da altura do membro posterior a partir do comprimento da pegada, para duas situações possíveis: 



Vamos agora estimar o valor possível para o comprimento da cauda de acordo com o seguinte modelo geométrico, onde d12  = a2 + b2 . Baseado num desenho de reconstituição do esqueleto de ''Iguanodon bernissartensis'' de O.C.Marsh á escala 1/40.






Sector D - Trilho de quatro pistas que apresentam boas impressões tridáctilas sendo notórias as marcas das garras dos dedos alongados. O valor do ãngulo entre o dedo médio (III) e o dedo interno (II) é de 18º, igual ao valor entre o dedo médio (III) e o dedo externo (IV). Apresentam formas semelhantes, mas pertencentes a animais de corpulência diferente, uma vez que os valores médios obtidos são, por exemplo, (figs 13 a 15) de: passada 1,62 m e comprimento 34,8 cm, ou passada 1,93 m e comprimento 44,2 cm ou ainda passada 2,30 m e comprimento 41 cm, situam-se no nível 3, com as orientações Nm 255ºE – Sm 45ºW; Nm 256ºE – Sm 76ºW; Nm 160ºE – Sm 20ºE. (Antunes, 1976).

 (Antunes, 1976)
 (Pinto, 2014)

Foram atribuídas a dinossáurios Terópodes Carnossáurios do tipo Megalosauros, (Antunes, 1976) que é comum na Europa, em Portugal detetaram-se várias jazidas com dentes e ossos (Gomes, 1915-16; Laparrent e Zbyszewski, 1959), além de que nas proximidades temos a jazida da Boca do Chapim onde se recolheram restos fósseis de Megalossauros. Além das pistas acima referidas ainda ocorrem duas dezenas de impressões tridáctilas pouco profundas com cerca de 10 cm de diâmetro, outras com 20,5 cm de comprimento por 21,5 cm de largura, com uma passada entre 1,5 e 1,9 m, pertencentes a formas Juvenis de dinossáurios bípedes (Antunes, 1976).

Megalosaurus, World Museum Liverpool

Com os dados recolhidos no local em 2014, vamos analisar uma sequência de pegadas numa pista deste sector, para se obter uma estimativa tão exacta quanto o possível do Comprimento da marca do pé, do Passo, da Passada, da Altura do membro posterior ao solo, do Tipo de deslocação e finalmente do Valor da velocidade de deslocação do animal.







Pode-se já concluir que o Terópode que produziu as pegadas teria um Pé com aproximadamente 29,75 cm de comprimento, que devido ao seu peso provocou impressões com uma profundidade de 2,78 cm, deslocando-se com um Passo de 193,67 cm e uma Passada de 373,00 cm. Com estes valores e aplicando a fórmula adequada a Terópodes em que o comprimento do pé é superior a 25 cm (Santos, 2008), 




determinamos o valor expectável para o comprimento do membro até ao acetábulo (articulação da anca), que neste caso seria de 1,46 metros. Quanto ao tipo de deslocação usamos a razão entre λ a, sugerida por Thulborn, 1982; e Wade,1984 e obtemos um valor igual a 2,56 o que recorrendo á respectiva tabela nos indica que o animal se deslocava em trote.

Finalmente usando a fórmula de Alexander proposta em 1976 determinamos o Valor da velocidade com que o Terópode se deslocava. 

Obtendo-se o valor de 16,33 Km/h.

Porem há que ter em atenção que embora todas as pegadas se encontrem no mesmo estrato, a primeira encontra-se numa zona onde o estrato sofreu deformação diferente causando-lhe enrugamento curvilíneo e que por acção tectónica se fracturou e ficou separado da outra zona, conforme é visível nas fotos seguintes:



O que implica que a distãncia medida entre esta pegada e a seguinte se encontre com um valor majorado positivamente, pelo que será de bom tom eleminá-la dos cálculos. Vamos então redeterminar os valores, tendo em conta esta situação:



O tipo de deslocação calculado pela razão entre λ a, matem-se no trote com o valor de 2,33. 

Enquanto o valor da velocidade passa a ser de 13,99 Km/h.  

Estes dinossáurios Terópodes carnívoros teriam entre 1,4 a 1,6 metros de altura entre o solo e a anca e um deles estaria a deslocar-se a cerca de 14 Km/h sendo a única evidência de movimentação tão rápida de um dinossáurio registada em Portugal (Santos,2003).



Texto: Orlando Pinto, 2015

              

           Lagosteiros Dinosaur Trackways

           Publicado por Britoca 06/06/2013 - YouTube



Origem das fotografias: Dinossáurios Eocretácicos de Lagosteiros ; en.wikipedia.org ; Google Maps ; O.Pinto

Bibliografia: Dinossáurios Eocretácicos de Lagosteiros - Universidade Nova de Lisboa, Miguel.Telles Antunes, 1976; Diário da República nº 105/97Theropod Locomotion - J. O. Farlow, S. M. Gatsy, T. R. Holtz, J. R. Hutchinson & J. M. Robinson, 2000, htt://dinosaurpalaeowww.prehistoric-wildlife.comEstimating Dinosaur Speed from Trackways - J Bret Bennington, Hofstra University - 2009; Dinosaur Locomotion - J. R Hutchinson, Stanford University, 2005; An Overview of Dinosaur Tracking - Glen J. Kuban, 1994-2010; Field-Trip Guide - The Mesozoic Evolution of South-Western Portugal: Algarve and Alentejo Basins. Rui Pena & Nuno Pimentel, Dublin 2012;