Minerais e Espeleoformas

    Património Natural

A Gruta , situa-se na Serra dos Pinheirinhos e tal como outras da nossa região, desenvolve-se em terrenos Calcários do Jurássico Médio (180-160 milhões de anos a.C.), Evoluindo preferencialmente na vertical e em profundidade, ao longo da junta de estratificação, chegando a atingir um desnível de cerca de 120m .

Foi descoberta em 04/06/2003 por Rui Francisco .



Do ponto de vista espeleológico, trata-se de uma cavidade Cársica. do maciço da Arrábida rica pela beleza imanada das diversas formações litoquímicas, provenientes das diferentes espeleoformas, produzidas pelos cristais de calcite e aragonite, formados ao longo de décadas e que agora nos surpreendem pela diversidade de formas : "Pipocas", "Perceves", Excêntricas e Botriodais. Numa profusão espectacular ao longo de toda a gruta.

Contráriamente ás outras grutas do sistema cársico do Frade, esta apresenta nas suas várias galerias e túneis cores em tonalidades de castanho, por vezes, muito escuro, contrastando com tons que variam desde o branco leitoso, passando pelo bege e amarelo.

O magnífico e elevado grau de concrecionamento que apresenta, produziu frequentes estalactites, estalagemites, colunas, bandeiras, tubulares, cascatas, excêntricas, flores, pérolas de gruta, etc...

Neste momento são conhecidas e já exploradas, mais de oito salas, e vários túneis, das quais destacamos:

Túneis: das Pipocas, Cónico, Biforcado, dos Cristais Dourados, da Cascalheira, dos Tormentos.  

Galerias e Salas: dos Contrastes, da Pedra Malhada, da Capela, Cavernícola, Inclinada, das Raízes, Colorida.

   

Foto Pedro CardosoTambém foi nesta gruta que os espeleólogos e biólogos do NECA observaram pela primeira vez dois artrópodes cavernícolas, não identificados á data. É surpreendente o aparecimento de exemplares da Anapistula ataecina (Cardoso e Scharff, 2009), de nome comum Aranha-cavernícola-do-Frade. Esta pequeníssima aranha foi descoberta em 2005, sendo a mais pequena da Europa (0.43-0.58mm), a espécie foi identificada e descrita em 2009 - First record of the spider family Symphytognathidae in Europe and description of Anapistula ataecina sp. n. (Araneae) por Pedro Cardoso Nikolaj Scharff . A sua área de distribuição é de apenas 1 a 2 Km2, no Sistema do Frade nas grutas da Utopia, do Fumo e do Coelho.

“… Não só se trata de uma nova espécie para a ciência, nunca antes vista a nível mundial, como os critérios mundialmente aceites da União Internacional para a Conservação da Natureza a classificam como “criticamente em perigo de extinção”. Como curiosidade, esta espécie aparenta ser partenogénica, ou seja, não existem machos dando-se a reprodução através de clonagem das fêmeas. Ainda não se tem a certeza, mas pensa-se que esta espécie será descendente de alguma outra aranha que existisse à superfície quando autênticas florestas tropicais recobriam toda esta área, há milhares de anos. Com a vinda das grandes épocas glaciais, algumas destas pequenas aranhas podem-se ter refugiado no clima mais “temperado” das grutas e aí ficaram até hoje. Os seus parentes mais próximos conhecidos estão agora restritos à floresta tropical Africana” (P. Cardoso, 2009).

Texto: Orlando Pinto, 2014


Apontamentos da visita inserida numa actividade da Vertente Natural em 2015-01-25

A entrada da gruta encoberta pela vegetação está orientada a 180º S, é bastante estreita e feita através de uma peça metálica que guarnece as paredes da mesma. São 10h e 17 m a temperatura exterior é de 16,2 º C e a humidade no ar é de 57%. 

Após a entrada na pequena sala com espeleotemas cobertos de argila pendentes do tecto, preparamos a primeira descida cerca de 8 metros, com a ajuda de cordas e assentamos os pés na sala denominada das Raízes, o nome advém das várias e enormes raízes da vegetação arbustiva da superfície, constituída maioritariamente por Carrascos (Quercus coccifera), Aroeira (Pistacia lentiscus), Azevinho-menor (Ruscus Aculeatus) e Tojo-gatunha (Ulex-densus) que pendem do tecto da gruta, alternando com estalactites e bandeiras, disputando entre si o protagonismo do cenário. No chão junto à parede do lado esquerdo surgem algumas estalactites.

A temperatura situa-se agora nos 18,7 ºC e a humidade no ar ronda os 95%. Ao percorrermos com o olhar a parede contrária, a da direita, observamos que num estremo ela comunica com uma passagem para a sala Colorida, à qual não acedemos por razões de preservação e no sentido oposto, ao fundo da sala deparamos com uma passagem bastante estreita que nos leva a um pequeno patamar onde com o auxilio de corda e o 8 metálico fazemos a descida de cerca de 7 metros até ao chão da sala Inclinada. Nesta sala à esquerda orientada a 220 º a Sw encontra-se um espectacular concrecionamento com brilho seroso que reveste toda a parede com cores variando do castanho escuro a claro passando por tons bege, a sua forma faz-nos lembrar uma enorme cascata. Continuando a nossa progressão passamos pela sala Cavernícola e chegamos à sala do Manto Branco.

 Aqui ao olharmos o tecto destaca-se um fabuloso e enorme Espelho de Falha quase na totalidade coberto por fina camada de calcite branca, mas onde são notórias as estrias e steps do deslizamento ocorrido, já no chão, um pequeno pedaço de espelho de falha do bloco que se separou com a inclinação oposta. São determinantes para percebermos a génese desta gruta onde as forças tectónicas estiveram na sua origem e seguidas pelos agentes químicos da água acidificada pelo dióxido de carbono, que lhe modelaram o espaço e produziram os belos espeleotemas que observamos. Os blocos caídos e fragmentados bem como pedaços de formações quebradas por acção de aluimentos e fracturação que forram o chão encontram-se muito concrecionados e apresentam formas diversificadas de cristalização da calcite, fases de cor castanha seguidas de fases de cor esbranquiçada, originando as bolinhas ou pipocas, as botrióides, os perceves e os aglomerados de cristais geométricos que fazem lembrar formas arborescentes de corais. As estalactites e bandeiras ocorrem com frequência e nas extremidades as gotas de água estão sempre presentes.

A temperatura e humidade estabilizaram respectivamente a 28,5º e 99%, seguindo em direcção à próxima sala deparamos com pequenos gours onde se formam as chamadas pérolas de gruta, no tecto junto a uma formação de bandeiras que nos recordam um aglomerado de medusas, encontramos a entrada do túnel das Tormentas que nos daria acesso a outra parte não visitável da gruta. A parede oposta encontra-se preenchida de bandeiras e estalactites com algumas tubulares com excêntricas na extremidade, já se vislumbra a sala da Pedra Malhada, o chão altamente concrecionado vai dando lugar a um caos de blocos que lateralmente começa a ficar também concrecionado, no tecto são visíveis bandeiras e estalactites ornamentadas com argila. Ao fundo do lado direito encontra-se outra passagem que liga à sala da Capela também vedada para preservação.

Começamos então a nossa viagem de regresso, deparando aqui e ali com mais pormenores fantásticos,  chegados à sala inclinada vamos subir pela chamada escada de Joli, usando a técnica bico de pé calcanhar alternadamente de forma a que a escada fique entre as pernas, e atingimos o patamar com a estreita passagem para a sala das raízes, e já se vislumbra a próxima etapa, a subida até à superfície desta vez feita com mãos, pés e joelhos.

    

    SlideShow - Visita à Gruta da Utopia

    Publicado por Orlando Pinto em 06/02/2015 - YouTube

     

Texto: Orlando Pinto, 2015













Origem das fotografias: Sistema Cársico do Frade - NECA ; espeleologia-neca.blogspot.pt/bioespeleologia ; espeleologia-neca.blogspot.pt/novas-especies ; Folheto Sistema Cársico do Frade - Gruta da Utopia ; Orlando Pinto

Bibliografia: Sistema Cársico do Frade - Núcleo de Espeleologia da Costa Azul, 2005; espeleologia-neca.blogspot.ptFirst record of the spider family Symphytognathidae in Europe and description of Anapistula ataecina sp. n. (Araneae) - P. Cardoso e N. Scharff, 2009); Flora da área cársica do Concelho de Sesimbra / F. Rasteiro A. Correia, J.Santos, 2009