A gruta da Garganta do Cabo situa-se no promontório do Cabo Espichel, nas falésias alcantiladas do Jurássico J-3, no sentido Este do "Focinho do Cabo". Possuiu duas entradas, ambas conhecidas desde sempre pelos pescadores e população local. A entrada inferior situa-se junto ao mar sendo denominada por "Furna", enquanto a entrada superior é conhecida por "Lapa ou Fojo das Pombas".
A primeira referência a uma descida á Garganta do Cabo é apontada como tendo sido efectuada em 1985, por elementos do CEAE-LPN (Centro de Estudos e Actividades Especiais - Liga para a Protecção da Natureza). A primeira exploração efectiva, com trabalhos de desobstrução foi levada a cabo pelo NECA - Núcleo de Espeleologia da Costa Azul), em 30 de Setembro de 1995.
Em 2006 e 2007 a gruta foi novamente explorada e topografada pelos espeleólogos do CEAE - LPN, tendo as actividades sido registadas em vídeo, e que lhes permitiu preparar a descoberta de outra grande maravilha subterrânea do Cabo Espichel a Gruta do Meio.
Rui Francisco YouTube
Para visitarmos a gruta é necessário contornarmos a falésia a cerca de 50 metros acima do nível do mar, para atingirmos a entrada superior a "Lapa das Pombas", uma cavidade fóssil com 4 metros de largura implantada numa plataforma a 30 metros da base da escarpa. Dentro do "Fojo das Pombas" deparamos com um buraco na vertical que nos permite ver bem ao fundo o mar, que por efeito da ondulação penetra pela entrada inferior da gruta, rugindo e lambendo as rochas laterais de uma imensa galeria.
Está na hora de montarmos o dispositivo de rappel que nos conduzirá á base desta galeria.
Atenção: este rappel é de dificuldade Elevada, só deverá ser feito, quando acompanhado por espeleólogos experientes conhecedores da cavidade e para o fazer deverá possuir conhecimentos de técnicas de descida e subida vertical.
Passo a transcrever a experiência relatada, por quem o fez pela primeira vez. (Revista Forum Ambiente Março 1996)
" ... Com uma espécie de broca manual, Cândido fixa na rocha dura as buchas (spits) que em princípio vão suportar a corda de rappel e, sobretudo, os nossos pesos. Aproveito para me sentar, na tentativa de parar o tremelique das pernas, enquanto observo aquele ritual do martelo a aflorar apenas a superfície da rocha. A bucha não vai além dos cinco milímetros de perfuração, mas garantem-me que está segura. O início da descida é uma experiência traumatizante. Lancei-me no vazio, de costas. Mais do que os olhos, os pés, apoiados na parede coberta de terra húmida, guiam-me o caminho. São trinta metros de rappel, com uma mudança de corda pelo meio. O último lance foi o mais difícil. Uma reentrância no lado direito da parede, que tento evitar a todo o custo, leva-me a, inadvertidamente, rodar sobre mim mesmo. As costas batem, sem grande impacto, na parede, e é assim de frente para o precipício, que alcanço o segundo patamar da viagem. Ainda a vinte metros de altura do mar, que se revolve vigorosamente, o suor já escorre pelas nossas caras... "
Já com os pés assentes em rocha firme, admiramos a galeria de 30 metros de diâmetro por 50 metros de altura, formada essencialmente por acção abrasiva do mar, reparamos a singularidade de o tecto ser constituído por um depósito de antiga praia. Observa-se também que na parede do lado esquerdo, iluminada ainda pela luz diurna que chega pela abertura da "Lapa das Pombas", a existência de pequenas condutas, tipo "gateiras", em que a progressão tem de ser feita recorrendo a técnicas de rastejamento, pertencentes a um conjunto em volta da sala. Estas condutas encontravam-se totalmente preenchidas por areias de praia consolidadas, foram desobstruídas pelo NECA em 1995, sendo hoje possível visitá-las. Exploramos a primeira conduta, situada numa falha a cerca de 30 metros, de tal forma estreita que entramos deitados, passamos á segunda e subimos por um algar para acedermos á sala principal começam a surgir estalactites e excêntricas, o chão apresenta poucas estalagmites.
Percorridos mais de duas dezenas de metros, atingimos a galeria principal, com uma inclinação de 45º, o tecto apresenta-se revestido por estalactites com 50 cm, e é lá que se encontra uma raríssima formação, com uma geometria abaulada, composta por milhares de pontículos cristalizados, o tesouro da gruta. Regressamos em sentido inverso, e apercebemo-nos de uma sensação estranha nos ouvidos, semelhante á que sentimos numa viagem aérea, estamos na galeria do vácuo, dai o seu nome de baptismo.
A segunda galeria é alcançada em sentido descendente, relativamente á primeira, não apresenta formações litoquímicas, sendo dominada por argilas, contem um algar que sobe e se vai estreitando até nos impossibilitar a progressão. Voltamos á sala de entrada e lá está o rappel de 35 metros para nos levar na subida á superfície.
Slide Show - Momentos na Gruta da Garganta do Cabo
Publicado por O. Pinto em 25/02/2014 - YouTube
Texto: Orlando Pinto, 2014
Origem das fotografias: espeleologia-neca.blogspot.pt ; sesimbrasubterranea.blogspot.pt ; carlossargedasfotografo.blogspot.pt
Bibliografia: Revista Forum Ambiente nº 24, Março 1996; Revista Forum Ambiente nº 49, Junho 1998; espelaion.blogspot.pt;